Esse é um blog de Clipping de Miguel do Rosário, cujo blog oficial é o Óleo do Diabo.

quinta-feira, 17 de junho de 2010

Folha 17/06 - - Conluio demagógico

De olho na urna, presidente Lula sanciona reajuste a aposentados, e candidatos ignoram debate sobre as consequências da medida

Um conluio demagógico de governo e oposição furtou do debate eleitoral um dos temas mais relevantes das políticas públicas -o da Previdência. O presidente da República, parlamentares de todas as siglas e os principais candidatos ao Planalto escamotearam as implicações políticas e financeiras de mais um reajuste dos benefícios do INSS.
Trata-se do aumento das aposentadorias de quem recebe mais de um salário mínimo mensal. Lula decretara um reajuste já superior à inflação de 2009, mas o Congresso decidiu elevá-lo ainda mais. Diante do exagero, o ministro da Fazenda sugeriu ao presidente que vetasse a medida.
Durante semanas, Lula encenou o teatro da responsabilidade. A postulante governista, Dilma Rousseff (PT), como era de prever, disse que seguiria o líder. O principal nome da oposição, José Serra (PSDB), anunciou que também estaria de acordo com a decisão presidencial. Premido pelo interesse de auxiliar sua candidata e pelo risco de ver o Congresso conceder aumento ainda maior, caso a matéria retornasse à Casa, Lula sancionou a decisão parlamentar.
O reajuste -que deverá gerar gasto extra de R$ 1,6 bilhão no ano, segundo cálculos oficiais- ressalta a face perdulária do governo, embora não vá provocar, por si só, uma calamidade fiscal.
No terreno do debate público, o problema maior é o absenteísmo intelectual, moral e político das figuras envolvidas na decisão. Situação e oposição não discutiram as implicações do aumento, o sentido da política de reajustes em vigor há duas décadas e os possíveis usos alternativos desses recursos.
Está em jogo um aumento de rendimentos de 8,3 milhões dos 27,3 milhões de beneficiários do INSS, que ficam com 52% de todos os pagamentos da Previdência Social. Em média, esse grupo recebe R$ 1.273 mensais. Mas a maioria dos beneficiários, 68%, ganha entre um e três salários mínimos -R$ 916, na média. O piso previdenciário é de R$ 510.
Nem de longe pode-se considerar que esses pensionistas sejam privilegiados -mas o rendimento médio do trabalho dos 21,8 milhões de brasileiros das seis maiores regiões metropolitanas, segundo o IBGE, é de R$ 1.424 mensais. Qual o sentido de ajustar o valor das aposentadorias a uma taxa superior à do crescimento da economia? Ao fazê-lo, é bom lembrar, transfere-se renda para quem está aposentado, embora haja população mais carente.
Diante disso, seria melhor, por exemplo, aplicar os recursos em programas como o Bolsa Família? Alguns acreditam que sim, mas é possível que não, pois cerca de 50% dos aposentados mantêm famílias extensas e exercem papel relevante em economias de pequenas localidades, praticamente à margem do mercado.
A questão crucial é saber até quando os reajustes previdenciários devem superar o crescimento da economia. Entre 1991 e 2009, o país cresceu 2,9% ao ano -e a despesa com o INSS, 7,5%, segundo cálculo do economista Fábio Giambiagi. Nesse ritmo os aposentados não caberão no PIB.
A menos de quatro meses da eleição, candidatos ao Executivo e ao Congresso pouco ou nada disseram sobre essas questões. De olho na urna, fugiram do debate.

Nenhum comentário:

Arquivo