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sexta-feira, 3 de setembro de 2010

Globo 03/09/2010 - - Ideologia atrapalha momento da Petrobras

A Petrobras multiplicou seus investimentos em mais de sete vezes nos últimos dez anos e tem pela frente grandes desafios. A indústria do petróleo como um todo responderá por cerca de 40% dos investimentos previstos para o Brasil até 2014.

Trata-se de uma oportunidade ímpar, pois esses investimentos criarão muitos e bons empregos, fomentarão avanços tecnológicos, abrirão espaço para fabricantes de equipamentos, insumos e prestadores de serviços dos mais variados portes.

Nesse sentido, a capitalização da Petrobras é uma iniciativa necessária, pois a empresa não teria como concretizar todos seus investimentos com os recursos provenientes do próprio negócio (geração de caixa e lucros). Embora o petróleo possa ser uma atividade altamente lucrativa, seria temerário que a Petrobras viesse a se endividar além do recomendável - e possivelmente o mercado financeiro cobraria bem caro para conceder tanto financiamento. Como os investimentos envolvem inevitavelmente riscos, o bom senso recomenda que a companhia tente bancar a maior parte dessas inversões com capital próprio adicional.

Na montagem dessa operação de capitalização, encontrou-se uma saída para não sacrificar financeiramente o Tesouro: em vez de desembolso em dinheiro, a União resolveu integralizar sua parte no aumento de capital com petróleo, o que para a Petrobras significa quase o mesmo.

Chama-se tecnicamente tal operação de cessão onerosa, pois um volume preestabelecido de petróleo é cedido em troca de determinado número de ações. As condições dessa troca deveriam respeitar parâmetros de mercado, até porque, para acompanhar o aumento de capital que será feito pelo sócio controlador (a União), os demais acionistas terão de aportar dinheiro vivo na empresa. No entanto, ao fixar essas condições, o governo mais uma vez "misturou as estações", cedendo petróleo à Petrobras por um valor que possibilitará ao Tesouro elevar consideravelmente a sua fatia no capital total da estatal, mas que pode restringir a participação dos demais sócios. Nesse caso, o objetivo da capitalização acabaria sendo prejudicado se de fato diminuir o interesse dos acionistas minoritários em participar, na mesma proporção da União, do aumento de capital da Petrobras. E essa diferença a União terá como cobrir com mais petróleo.

Infelizmente, esse quadro causou enorme desgaste nas cotações dos papéis da Petrobras nas bolsas, como reflexo da desconfiança dos investidores em relação a ingerências políticas em uma questão que deveria ser meramente empresarial. Porém, como o governo resolveu ressuscitar o viés ideológico que por tantos anos envolveu o setor do petróleo, o resultado não poderia ser diferente. No lugar de os mercados estarem eufóricos com o momento pelo qual passa a Petrobras, existem dúvidas e apreensões. Só resta agora torcer para que os mercados apostem nas boas perspectivas de médio prazo do petróleo no Brasil e passem por cima dessa contaminação ideológica da operação.

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