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sábado, 15 de maio de 2010

Panorama Econômico :: Míriam Leitão - 14/05/2010

Gastança federal

O governo Lula deixará uma pesada herança fiscal para quem quer que seja que lhe suceda. O corte anunciado ontem é uma gota num oceano de gastança. A maior parte da queda do superávit primário foi para aumento de despesas de custeio, pessoal e Previdência. A dívida pública bruta cresceu fortemente e isso só não aparece na dívida líquida pelos truques contábeis.

Confira nos gráficos abaixo. Em outubro de 2008, o governo destinava para superávit primário 16% da Receita Corrente Líquida. Hoje, ele destina apenas 6%. Receita Corrente líquida é o que fica nos cofres federais, depois dos repasses para estados e municípios. Pelos cálculos do economista político Alexandre Marinis, sócio da consultoria Mosaico, essa queda do superávit primário não significou um aumento de investimento. Antes da crise, o governo investia 5% da sua receita, agora, destina 6%. O aumento foi de apenas um ponto percentual. Mas as despesas de pessoal, Previdência, custeio e outras despesas obrigatórias, que já engoliam 79%, foram para 88%.

- Do ponto de vista da sustentação do crescimento econômico no futuro, é difícil imaginar uso mais ineficiente dos recursos públicos - diz Marinis.

A Tendências consultoria calcula que as despesas do governo cresceram em média 7,7% ao ano nos últimos 10 anos enquanto o PIB cresceu bem menos, 3,3%. Se esse aumento fosse concentrado nos investimentos, o gasto seria saudável. O problema é que ele se concentra em salários para funcionários públicos, reajustes no INSS e nas despesas correntes, que são gastos para o próprio funcionamento do governo. Para se ter uma ideia da diferença de valores, nos 12 meses terminados em março, o governo e o Banco Central gastaram R$597,1 bilhões. Desse total, R$154,4 bilhões foram para pagamento de pessoal; R$232,8 bilhões, para benefícios previdenciários; e apenas R$39 bilhões, para investimentos.

O único ano em que houve um ajuste fiscal foi 2003. Depois, o governo aumentou fortemente o número de funcionários; não regulamentou a única reforma que fez; a da Previdência Pública; e tem usado truques contábeis para esconder o aumento do endividamento. Note, por exemplo, num dos gráficos, o aumento dos créditos repassados ao BNDES. Esse é um dos truques. O governo alega que empresta ao banco, mas na verdade está aumentando o capital do banco de fomento, que concede empréstimos subsidiados muitas vezes para as próprias estatais.

- O Tesouro empresta para o BNDES com juros em torno de 5%, só que paga 9,5% de juros, que é a taxa Selic, para rolar a própria dívida. Ou seja, o Tesouro está tomando prejuízo na operação - explicou Felipe Salto, da Tendências.

A declaração do ministro Guido Mantega de que será feito um corte de R$10 bilhões e o aviso do ministro Paulo Bernardo de que "vai doer" não impressionam. Ao longo dos últimos anos o governo ampliou de forma extravagante seus gastos. Essa é a herança que ficará para a próxima administração. Marinis acha que se tivesse mantido constante, depois de 2003, as despesas de pessoal e custeio em relação ao PIB, o governo poderia ter aumentado em 45% os investimentos. Felipe Salto acha que o corte anunciado serve para apagar incêndio.

- O governo tem que fazer cortes pensando num horizonte mais longo. O que foi anunciado é mudança de curto prazo para apagar incêndio. Por não ter feito isso antes, teremos mais juros e crescimento menor do PIB a partir de 2011. Crescer um ano é fácil, mas a partir do ano que vem vamos entrar num ciclo de crescimento mais baixo - afirmou Salto.

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